Correndo mais do
que o célebre maratonista tcheco Emil Zátopek e escolhendo pessoas certas para
emitirem pareceres subordinados aos interesses de um grupo fechado, aparentemente
o processo que beneficiou Gustavo Nogueira e pode estender canhestramente o mesmo ganho
a Secretários que intervieram ostensivamente, como o Consultor Geral do Estado,
e através de aparente omissão, como a chefe da Casa Civil, advogada Tatiana
Mendes Cunha, só não era do conhecimento de uma pessoa, o governador Robinson
Faria, que deve à população a adoção de providências moralizadoras.
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Conduzido integralmente à revelia do Governador, o processo... |
É todo cheio de nós pelas costas e
riquíssimo em irregularidades, como ocorre com matérias-primas do trabalho de
promotores de justiça da área criminal, o processo de consultas com que o
secretário estadual de Planejamento, economista Gustavo Nogueira, conseguiu que
outras secretarias do governo Robinson Faria coonestassem, como pretendem, o
reajuste de 100% que ele concedeu há poucas semanas ao que o governo do Rio
Grande do Norte lhe paga.
Rico em especificidades que contrariam o
direito positivo em vigor no Brasil, ele experimentou uma tramitação
ultra-célere, em contraposição a chá de cadeira e aos meses e anos que muitas
vezes retardam os de interesse de cidadãos e servidores comuns, recebeu
pareceres de servidores do segundo escalão à revelia dos titulares das respectivas
pastas e para surpresa geral levou o consultor geral, professor Eduardo Nobre,
a recebê-lo e devolvê-lo em tempo recorde, emprestando-lhe o aval fundamental.
Técnicos
descobriram
A descoberta dos inúmeros vícios que
carimbam o processo coube a técnicos do Tribunal de Contas do Estado que
resolveram investigá-lo por contra própria antes de os participantes da corte,
conselheiros, resolvessem, na semana passada, que o reajuste dado a Gustavo
Nogueira seja rigorosamente investigado. Pelo menos um promotor de justiça, o
bacharel Paulo Batista Lopes Neto, coordenador das promotorias de Defesa do
Patrimônio Público no Rio Grande do Norte, resolveu também investigar essa
fraude.
Eles agora torcem para que Robinson tome
a iniciativa de anular o feito, cobrar o ressarcimento do que foi pago
ilegalmente e afaste de sua equipe todas os protagonistas dessa história que
consagra a máxima pseudamente bíblica do “Mateus, primeiro os teus” em
detrimento dos contribuintes e cidadãos potiguares.
Despachos
em minutos
Para se ter idéia da sucessão de
irregularidades, pode-se iniciar a leitura pelo fato de Gustavo transformar em
institucional, em nome da pasta que dirige, uma consulta sobre vencimentos que
a rigor, na forma da lei, deveria ter sido subscrito pelo servidor.
...que reajustou o salário de Gustavo, abrindo caminho para outros... |
O mal maior seria, porém, mostrar que a
definição do valor do salário é regida por lei estadual que o servidor
considerou inconstitucional e, com base nesta análise, não se procurar
extinguir a inconstitucionalidade, através do envio de nova lei à Assembléia
Legislativa ou do ajuizamento de uma Ação Declaratória de Inconstitucionalidade
(Adin), e sim induzindo o Estado a deixar de cumpri-la, aí, sim, praticando
deliberadamente uma ilegalidade, em afronta aos ditames da legislação em vigor.
Pesa ainda o fato de, depois de receber
o carimbo de interesse da Secretaria de Planejamento e Finanças, o que equivale
a dizer da pasta que controla o cofre do Estado, escondendo o interesse
particular do servidor que dirige esta pasta, e contando com a conivência de ocupantes
de cargos de confiança do segundo escalão, em corrida mais ágil do que as do
célebre checo Emil Zátopek, o processo beneficiou o requerente e estabeleceu
condições para que os titulares de pastas que compartilharam a encenação
receberem, eles próprios, igual benefício.
Rastros
da ilegalidade
Numa unidade federativa em que
requerimentos de cidadãos e mesmo servidores estaduais levam meses, e às vezes
anos para receber uma assinatura de Secretário, a trajetória do reajuste de
Gustavo é atípica e cheira mal, destacando-se entre os feitos que caracterizam
o governo Robinson Faria como o das “galinhas mineiras”, aquelas que, segundo o
ex-deputado Manoel de Medeiros Brito, ex-secretário estadual de Justiça e
Cidadania, “só ciscam para dentro de seus quintais”, em detrimento do interesse
geral.
Levou apenas dois dias na área em que
recebeu foros de decisão.
...secretários, como Eduardo Nobre, arranhou a imagem profissional dele... |
Tudo começou com uma consulta à assessoria
jurídica da secretaria de Administração, que Gustavo ainda acumulava com a de
Planejamento. Dado o “start” às 8h44m12s de 11 de março, o processo chegou ao
gabinete do secretário às 8h58m47s, seguiu para o protocolo às 11h49s14s e dali
seguiu para o Sub-Gabinete Civil do governo do Estado, onde desembarcou às
12h42m34s.
Tatiana
deixou passar?
Neste estágio, observa-se que o processo
não foi encaminhado à titular da Casa Civil, advogada Tatiana Mendes Cunha, que
ordinariamente não deixa nada escapar a seu controle na pasta. Há poucas
semanas, por exemplo, ela afastou de seu estafe um auxiliar porque chegou à
conclusão de que ele beneficiava a primeira-dama, advogada Julianne Faria,
secretária estadual do Trabalho, Habitação e Promoção Social. Tatiana é um dos
quatro servidores enquadrados na situação de Gustavo e potenciais candidatos a
pedir o benefício dos 50% que este garimpou para si. Como se sabe desde a
semana passada, trata-se do pagamento de duplo salário.
O que o Secretário de Planejamento pediu
é que o governo potiguar lhe pague salário integral, assim como a outros
servidores de outros órgãos colocados à disposição do executivo estadual. Pela
legislação vigente, quando optam pelo recebimento integram dos salários dos
órgãos de origem esses servidores só podem receber do Estado 50% do que este
pagaria por salário integral.
No time dos principais potenciais
interessados neste aumento estão os secretários da Saúde, médico Ricardo Lagreca;
de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Maírton França; de Esportes, vereador
George Câmara (PCdb), da Agricultura, Haroldo Abuana, e a própria Tatiana.
Pois bem, a despeito de toda esta sua
vinculação com a causa e de não deixar passar nada sob seus olhos sem
interferir no processo, a consulta de Gustavo se contentou na Casa Civil com o
despacho de um auxiliar da titular da pasta, voltando à secretaria de
Administração e passando desta para a de Planejamento e Finanças, sempre em
questão de minutos. Quem a conhece estranha que tenham passado a perna em
Tatiana.
Rasgando
o diploma
Eivado assim de peculiaridades a favor
do impetrante, o processo desembarcou na mesa do Consultor Geral do Estado,
professor Eduardo Nobre, às 12h12m11s de 26 de março, e em seguida foi e voltou
em poucos minutos ao protocolo, para retornar com a mesma rapidez e, depois de
ziguezaguear entre estas duas instâncias da pasta, deixou-a às 16h50m23s devidamente eivada pelo parecer que
viabilizou o reajuste.
...e com uma inédita omissão de Tatiana, outra potencial beneficiária. |
Reproduzindo comentários de operadores
do direito que também se debruçaram sobre o processo, que é público, os
técnicos do Tribunal de Contas acham que Nobre, até então sinônimo, também, de
reputação ilibada, rasgou seu diploma com esta assinatura, independentemente de
enquadrar-se, aos olhos de muitos conhecedores do caso, como seqüenciadores de
Gustavo no pedido de resgate dos 50% dos vencimentos de seus cargos.
O parecer de Nobre é, exatamente, aquele
em que o defensor do respeito ao Direito no âmbito do governo, responsabilizando-se
pelo saudável aconselhamento ao Governador, diz que se uma lei parece
inconstitucional deve ser descumprida sem a necessidade de se promover sua revogação.
Sub-procurador geral da República
aposentado, Nobre é também um potencial candidato ao reajuste porque recebe 50%
do que ele e alguns operadores do direito abrigados à sombra do executivo
potiguar batizaram como subsídio, atribuindo a seus salários a mesma
denominação que ancestralmente era restrita à dos deputados estaduais.
Pernoitando na área da Consultoria
Geral, no dia 7 de abril o processo desembarcou logo cedinho sobre a mesa do
Secretário de Administração. Num Estado em que as repartições públicas jamais –
escreva-se isto em letras graúdas: JAMAIS – começam a trabalhar antes das 8
horas, o processo foi protocolado ali às 07h40m06s, subindo para a mesa de
Gustavo às 08h57m45s, passando para um órgão da pasta chamado Copag, onde
aportou às 09h23m17s, e retornou ao gabinete do titular para ser positivado no
direito potiguar às 11h16m14s.
Cuidadosamente, os autores deste roteiro
cinematográfico excluíram do time de examinadores compulsórios da matéria a Procuradoria
Geral do Estado. Da mesma forma, não se tem notícia de sua apreciação pela
Controladoria Geral do Estado, cujo titular, advogado Ricardo George Furtado de
Mendonça e Menezes, não tem sido mencionado como ligado a esta saga de honestidade.
E do governador Robinson Faria, nessa
enrolada toda, necas de pitibiriba, como diria o legendário jornalista Luiz
Maria Alves.
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(Em 150615).
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