quinta-feira, 9 de julho de 2015

Luciano Barros ainda teme o "rolo compressor" do TCE

Sem se deixar contagiar pela sensação de que venceram a guerra ao desmentir o Tribunal de Contas, que não os acreditava donos do terreno que disputam, os moradores do edifício Luciano Barros esperam da corte ataques ainda piores do que a utilização do governador Robinson Faria, porque a mobilização deste pela repartição colegiada terminou emprestando-lhe argumento capaz de levá-los a continuar donos do que lhes pertence, um imóvel situado numa das regiões de metro quadrado mais caro de Natal.
A movimentação pública de ontem é símbolo de uma
mobilização que
permanece até o fim do esbulho governamental.
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ROBERTO GUEDES
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Uma sensação de paz se instalou ilegitimamente entre os natalenses que há dias questionavam a desapropriação de parte do terreno do condomínio Luciano Barros, em Petrópolis, para abrigar o estacionamento de veículos pertencentes ao Tribunal de Contas do Rio Grande do Norte e aos servidores destes, a partir dos sete integrantes de sua cúpula, os conselheiros que formam seu núcleo decisório. Os condôminos, porém, ainda não comemoram vitória, antes preparam-se para estocadas piores. 
A causa do equívoco em que evitam mergulhar é o fato de haver desabado no âmbito da corte a certeza de que ela jogou estupidamente errado ao veicular a convicção de que o terreno em questão não pertenceria aos moradores do edifício, seu vizinho que se destaca historicamente como a primeira habitação coletiva vertical do trecho da avenida Getúlio Vargas em que o Tribunal de Contas se reúne desde os anos sessenta.
Um desmentido com que os condôminos do Luciano Barros calaram o Tribunal de Contas do Estado espargiu em Natal a impressão de que finalmente a corte havia desistido de incorporar o terreno a seu patrimônio, em detrimento dos direitos dos proprietários, encerrando uma peleja que tem como cenário e troféu um dos metros quadrados mais caros da capital potiguar.
"A única batalha que vencemos até agora foi a da verdade", afirma o médico Ivis Bezerra, líder dos condôminos, salientando o desmentido com que estes calaram a corte de Contas. Um outro morador sugere que os dirigentes do Tribunal de Contas do Estado sejam chamados a responder pela produção de documento em que desonestamente a corte acusou os condôminos de não serem legítimos donos do imóvel que defendem.
Sem rendição
A rendição, entretanto, ainda não foi assimilada pelos conselheiros que mandam no tribunal, a despeito de sua causa estar angariando reações em contrário em todos os ambientes, inclusive na Assembléia Legislativa potiguar, onde despertou a oratória do deputado estadual José Dias (PSD), vizinho de rua dos contendores, e provocando risos em larga escala. O pior alvo da hilaridade parlamentar é, a propósito, uma pessoa muito querida na casa. Trata-se do vice-governador Fábio Dantas, que terminou aparecendo como pai do monstrengo do Tribunal de Contas ao substituir o governador Robinson Faria no ritual da desapropriação indigesta. 
Os conselheiros de contas encomendaram a assessores estudos que possam resgatar o que acreditam ser o direito da corte em prejuízo do condomínio. A qualquer momento o tribunal esgrimirá o lance que seus juristas viabilizarem, porque a decisão de abrigar seus carros no terreno vizinho está mais do que consolidada, como previu ontem ao Blog de Roberto Guedes um alto funcionário da casa.
Na verdade, porém, os integrantes do Condomínio Luciano Barros, dono do edifício homônimo e por extensão do terreno almejado pelos conselheiros, não querem dormir porque têm certeza de que o Tribunal de Contas do Estado já acordaram do impacto causado pela constatação de seu erro e tudo fará para colocar em prática uma revanche que os imobilize.
"As fotos da mobilização pública de ontem sugerem que estaremos permanentemente mobilizados enquanto não afastarmos definitivamente a ameaça de esbulho governamental", diz um morador, evitando identificar-se para não atrair contra si a ira dos dirigentes da corte de contas, os quais, a seu ver, "escolheram o Luciano Barros 'no apoio'". 
Usando o Governador
Os moradores do Luciano Barros esperam do Tribunal de Contas algo ainda pior do que a forma como o governador Robinson Faria reafirmou ontem que aderiu à causa dos conselheiros. Em decreto que publicou no “Diário Oficial do Estado”, o Governador abriu um crédito suplementar de 1,5 milhão de reais para que a corte cubra a desapropriação.
Segundo moradores, ao utilizarem Robinson os conselheiros deixaram claro que farão tudo para vencer a parada, porque já a tomaram como questão pessoal, não importa quanto custe nem a quem penalize.
O segundo ato público que os condôminos do Luciano Barros promoveram em defesa de seu terreno, realizada ontem, teve exatamente o objetivo de mantê-los mobilizados para resistirem melhor à ação que esperam dos adversários. Enquanto isto, o líder dos proprietários do edifício, médico Ivis Bezerra, que também é no time o portador de mais amizades entre os integrantes do Tribunal de Contas do Estado, cuida junto a operadores do direito no sentido de secundar a resposta de anteontem com uma ação judicial “redonda”, como dizem noutro campo em que sua diplomacia faz sucesso, o do futebol, para que o Tribunal não mais insista em tentar tomar na marra seu imóvel.
Não tinha o dinheiro
Eles já elencaram vários fatos e desenvolveram argumentos capazes de encostar o tribunal no canto do ringue. Entre os dois melhores raciocínios que os advogados mobilizados pelos condôminos destacam-se dois que lhes foi dado de presente anteontem pelo Governador e pelo próprio Tribunal de Contas do Estado.
Ao defender em documento oficial a sua proposta de indenizar os vizinhos incômodos com 1,7 milhão de reais por metro quadrado, no processo de desapropriação que deflagrou o conflito, a corte se perdeu nas suas alturas ao dizer que o terreno em litígio não pertence aos condôminos. Minutos depois, estes demonstraram o contrário, calando os conselheiros ao publicar documentos cartoriais que comprovam sua propriedade.
O outro argumento é o da improvisação com que a corte resolveu ganhar a questão a ferro e a fogo. Tão logo veio a publico a manobra da desapropriação, que o Blog de Roberto Guedes divulgou em primeira mão ainda em 25 de junho, quando noticiou o problema sob o título “Robinson toma terreno de particulares para dar ao TCE”, o Tribunal de Contas correu a dizer que a desapropriação não criaria ônus a ninguém porque já tinha o dinheiro para bancar a transferência de titularidade do imóvel.
Errando muito com seu jeito de "rolo compressor", o
Tribunal de Contas pagou mico para saber que o terreno tem dono,
ao contrário do que havia afirmado em documento oficial.
Caso a tivesse sido verdadeira a arrumação prévia do dinheiro tivesse precedido a sofreguidão com que os conselheiros resolveram lançar mão do terreno alheio, o Tribunal de Contas do Estado não teria pressionado Robinson para ceder-lhe oficialmente anteontem o dinheiro que lhe disponibilizou com esta finalidade.
Embora desconsiderada cotidianamente em todo o país, a regra de desapropriações diz que nada pode ser afetado por este tipo de intervenção governamental se o dinheiro para indenizar os atingidos não já estiver ouvindo a conversa. Neste caso, o único tilintar que se ouviu veio do poder executivo, a despeito mesmo de este cuidar muito pouco de suas finalidades precípuas sob o argumento de que não tem recursos.   
Por que pagaria a invasores?
A outra linha de defesa fornecida pelo Tribunal de Contas aos condôminos está na convicção com que este os declarou ocupantes ilegais do imóvel. Se tinha esta certeza, por que o Tribunal de Contas resolveu indenizá-los, em lugar de expulsá-los do quintal do Luciano Barros sob o argumento de algum tipo de esbulho possessório?
Esta é uma contradição que, enquanto poder fiscalizador, um tribunal de contas nunca aceitaria como prática de qualquer gestor submetido a suas lupas. Se o suposto proprietário do bem sujeito a desapropriação não é seu legítimo dono, por quê o ente público lhe pagaria? Os furos que o Tribunal de Contas expõe na sua atitude, porém, vão mais longe.
Impacto no trânsito
Sentindo cheiro de muita subjetivação do que deveria ser tratado objetivamente pelo poder público, o braço jurídico do condomínio residencial avança em outras direções que tendem a pelo menos dificultar a realização do súbito sonho dos conselheiros. Uma delas é levantar a questão do impacto no trânsito com base na legislação que Natal criou a este respeito, pioneiramente, aliás, há vários anos, graças à efêmera atuação do engenheiro Medeiros como vereador.
A lei diz que um empreendimento predial não pode ser tocado se causar problemas ao trânsito da área em que se situa seu imóvel. No caso, a implantação de um estacionamento numa estreita rua eminentemente residencial, caso da rua Professor Paulo Pinheiro de Viveiros, artéria situada nos fundos da sede do Tribunal de Contas, representa risco, certeza ou convicção de que causará enorme impacto negativo para os moradores do logradouro.
Não foi sem sentido que os moradores dos edifícios situados nesta rua participaram, destacadamente, do ato público que os condôminos do Luciano Barros promoveram ontem diante do Tribunal de Contas: na verdade, forando a questão patrimonial, o litígio confronta menos a corte contra os donos materiais do terreno em questão do que com os moradores da rua de baixo.
Prefeitura e promotoria  
“O direito coletivo destes moradores é ainda mais defensável do que o dos donos de bens submetidos a desapropriação em função do interesse público”, diz um advogado, lembrando que organizações poderosas já tiveram que se curvar diante das exigências da lei do impacto no trânsito.
O prefeito Carlos Eduardo, ainda ausente, tem
muita contribuição a dar aos moradores do Luciano Barros.
 
Quanto a este aspecto, acrescenta, os litigantes podem agir através de duas interpostas pessoas que têm poder coercitivo, a prefeitura de Natal e o ministério público estadual, a quem compete fazer respeitar a lei de impacto no trânsito. Um morador amigo do prefeito Carlos Eduardo Alves resolveu procurá-lo para tratar do assunto, lembrando que o burgomestre tem ótimas relações com o edifício.
O pai do Prefeito, o jornalista e político Agnelo Alves, falecido há poucos dias, como deputado estadual pelo PDT, aos 83 anos, morou durante mais de vinte anos no Luciano Barros, onde recebia o filho praticamente todos os dias para uma refeição e principalmente para conversarem sobre política. O condômino que quis entronizar Carlos Eduardo na causa, em defesa de seu grupo, soube que o burgomestre havia passado quase toda a última semana em São Paulo, em função de questão de saúde na sua família, devendo estar a postos para a causa de hoje para amanhã. 
Luciano, que se destacou em relação ao "Prédio Mico" do
ministério público estadual, deve se manifestar logo sobre o conflito
entre o Tribunal de Contas e os moradores do Luciano Barros.
Prédio “Mico”
Um terceiro ente público que tem legitimidade de sobra para entrar neste campo é o Ministério Público de Contas, vinculado ao tribunal, que tem muito “know how” sobre o assunto pelo menos desde que investigou o descumprimento da lei na compra de um imóvel com estacionamento insuficiente, na esquina da avenida Deodoro com a rua José de Alencar, no encontro entre os bairros de Cidade Alta, Baldo e Tirol, pelo ministério público estadual.

Há pouco tempo, o ministério público de Contas apontou uma Procuradora de Justiça como responsável pelos ônus que a compra desse imóvel, batizado como “Prédio Mico do Ministério Público”, impôs ao “parquet” estadual, querendo que ela indenize os cofres públicos com o prejuízo monetariamente atualizado.
O ministério público especial de Contas ainda está silente a respeito do conflito entre o Tribunal de Contas e os moradores do Luciano Barros, talvez por ser parte da causa, em litisconsórcio com o Tribunal de Contas, ou apenas porque seu titular, procurador Luciano Silva Costa Ramos, ter passado alguns dias fora de Natal, em férias.
Força
Mais importante do que estas questões, entretanto, para um dos operadores do direito que se debruçam sobre o conflito, é o real interesse que motiva o Tribunal de Contas do Estado, que aparentemente despreza regras básicas de planejamento, indispensáveis em administração e principalmente na gestão pública.
Ele acha que estão lidando com um oponente que, quando quer, não respeita limites. Alude a alguém com muito poder na corte que se deixou invadir subitamente pelo desejo de fazê-la tomar o terreno aos legítimos donos e saiu cooptando para sua causa quem encontrasse pelo caminho, notadamente o vice-governador Fábio Dantas, que há anos alimenta o sonho de integrar o Tribunal de Contas do Estado.
Ainda sem ter nome e rosto, ao menos publicamente, esse “rolo compressor” parece haver passado por cima do fundamental ao querer transformar em interesse público, forjando a legitimação para agir do Tribunal de Contas, o que não passa de questão menor. Afinal de contas, é mesmo questionável a razão que justificaria a desapropriação.
“Babilônia” inadequada
Como argumentam os condôminos do Luciano Barros, se sofre hoje com falta de estacionamento para os automóveis próprios e os de seus servidores e visitantes, o Tribunal de Contas do Estado é o único responsável, por imprevidência. Ele deveria ter previsto o aumento progressivo de áreas de estacionamento quando planejou a construção de sua sede, que muitos outros ocupantes do poder público mencionam como “Babilônia”.
“Se o tribunal tivesse cuidado saudavelmente do assunto este não estaria hoje transformado num problema e num conflito em que ele pensa em passar por cima de todo mundo com um tanque de guerra”, salienta um morador do Luciano Barros. O argumento, porém, tem mais profundidade.
Burocracia entre residências
Quando o Tribunal de Contas anunciou o projeto de construção de sua sede, contrários mostraram logo que seria impróprio investir daquela forma num quarteirão eminentemente residencial.
A bem da verdade, o prédio do Tribunal de Contas do Estado passou então a ser o único imóvel não residencial do quarteirão, porque os sete conselheiros que então mandavam na repartição colegiada não queriam abrir mão do visual de que dispõem desde os anos sessenta, o do imenso mar que se descortina das salas do alto da avenida Getúlio Vargas em que têm sede, ancestralmente, algumas das mais notórias rodas de bate papo em horário de trabalho em todo o Rio Grande do Norte.
Não cuidaram de estudar melhor, naquela ocasião, as implicações futuras de seu duplo equívoco – o de chantar seu arranha-céu no lugar errado e de economizar na produção simultânea das vagas de estacionamento que agora lhe fazem falta. Parece que a cura para essa incúria está em tomar o alheio, o que se confronta radicalmente com a finalidade precípua da corte, que fiscaliza gestões para evitar que gestores públicos passem os pés pelas mãos e juntem o alheio com o seu.
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(150709 às 09h48m). 

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